Pode alguém ser irmã, prima, madrinha e tia ao mesmo tempo? No meu caso, pode e a consequência é a formação de uma família exemplar para a qual tenho uma enorme dívida de gratidão. Mas como é a história? Ela começa nos anos 50 do século XX e tem um desfecho agora mesmo, neste ano de 2022.
Eu era criança quando uma das irmãs de minha mãe faleceu e deixou uma extensa prole. Uma delas era a menina Elza. Meu tio, recém viúvo, teve dificuldade para cuidar dos filhos e minha mãe levou a menina para nossa casa, onde se integrou, cresceu, virou adolescente, adulta e se casou. Ela nunca foi adotada formalmente, mas foi criada como se fosse filha, tornando-se, em consequência, minha irmã. Foi a primeira adição a quem já era minha prima de primeiro grau.
DEPOIS DE IRMÃ, MADRINHA E TIA
A menina Elza, que cresceu junto comigo, embora tivesse mais idade, transformou-se, mais tarde, em minha madrinha, graças a um dos vários ritos que compõem a fé católica, que minha família professava e na qual fui criado. Veio, então, o terceiro item de uma relação que já era próxima. Eu tinha uma irmã, que era prima e acabava de se transformar, também, em minha madrinha. De certa forma, um reconhecimento a quem estava tão próximo e ajudava minha mãe nos afazeres da casa.
A criança que chegou à nossa casa e nela foi criada, com os anos transformou-se em uma bela moça e atraiu a atenção de um jovem que, por coincidência, era irmão do meu pai. Os dois se aproximaram e Rafael começou a namorar a Elza. Era a possibilidade de estreitamento dos laços entre nossas famílias, tornando-as ainda mais próximas.
O namoro não durou muito e veio o casamento. Minha irmã, prima e madrinha acabava de se transformar, também, em minha tia. Casados, Elza e Rafael foram morar próximos de nossa casa e vimos o nascimento do primeiro filho, o Hermínio, que de certa forma foi o primeiro neto de minha mãe e meu pai. Depois, vieram outros filhos, totalizando nove deles.
A MINHA DÍVIDA DE GRATIDÃO
Quando minha irmã, prima, madrinha e tia estava começando a jornada de sua família junto com o meu tio Rafael, mudamo-nos, deixando a região do Caparaó, e voltado ao município de Alegre, onde meus pais tinham uma propriedade, a Fazenda Cachoeira. A família de tio Rafael veio junto, mas não ficou muito tempo. Em busca de oportunidade, mudou-se para o Norte do Espírito Santo e, depois, para Vitória.
E foi por morarem em Vitória que constitui minha dívida de gratidão. Deixei a fazenda e vim morar com eles, ainda nos anos 90 do século XX. O objetivo era estudar e trabalhar. Apesar das dificuldades, devido grande família, fui muito bem acolhido. Posso dizer, com absoluta certeza, que era, para meu tio e minha madrinha, muito mais do que um sobrinho – do lado de tio Rafael – ou um afilhado – no de madrinha Elza.
Se não fosse por eles – e pela família exemplar que criaram – não teria tido a oportunidade de estudar e transformar minhas perspectivas de quem nasceu no meio rural e só tinha como sair dele mediante a educação. Graças a eles, pude começar a trabalhar e cumprir meu objetivo de estudar. Recebi o suporte para começar uma nova vida e com eles fiquei até ter minha própria casa.
UMA FAMÍLIA GRANDE E LINDA
Rafael e Elza formaram uma família grande e linda. Seus filhos, a exemplo do que aconteceu comigo, seguiram adiante, estabeleceram-se, criaram suas próprias família, expandindo o que lhes havia sido ensinado. Nela, estão parte das minhas raízes e foi o suporte deles que me permitiu ser o que me tornei mais tarde, um intelectual, alguém bem distante do meio rural e do trabalho na agricultura. Foram eles que me deram o suporte para começar, voltar a estudar, sonhar em chegar à faculdade, realizar o sonho, estabelecer-me profissionalmente, casar-me e ter minha própria família.
Neste ano de 2022, os dois se foram. Primeiro, tio Rafael, alguém que sempre se preocupou com a saúde, acabou falecendo de repente, sem causa aparente. Em um momento, ele estava em casa, conversando. No seguinte, tinha nos deixado. Foi um choque, o primeiro deles. Agora, quando o ano se aproxima do fim, também minha madrinha – irmã, prima e tia – também se foi em circunstâncias similares. Foi um segundo choque.
A vida nos dá e a vida nos tira. Sou muito grato – e por mais que seja, nunca vou pagar a dívida que tenho – ao tio Rafael e a madrinha Elza. Os dois foram decisivos na minha caminhada. Sem eles, dificilmente teria me tornado quem me tornei. De outro lado, tenho orgulho de quem foram, da família que criaram e o que conquistaram.
Hoje, o que posso dizer é MUITO OBRIGADO, reconhecendo a importância deles na minha vida e contando essa história de quem, de prima, se transformou em irmã, madrinha e tia. E que, no final, foi, de certa forma, uma segunda mãe para mim.
Tio Rafael e madrinha Elza sempre serão lembrados e vão deixar saudades eternas.
2 Respostas
Lino que história linda sobre sua vida. Edy e eu também fazemos uma pequena parte ao lado da minha afilhada Solange.
Parabéns primo pelo lindo artigo!
Sentiremos sempre muitas saudades e teremos lindas recordações dos momentos vividos ao lado deles, o que nos conforta é saber que eles estão na presença de Deus.