Combinando um final de semana prolongado, graças ao feriado de Finados, e as chuvas que caíram quase que de forma contínua no Espírito Santo, acabei ficando muito em casa e, com isso, pude me debruçar sobre o que os jornais locais publicaram -além do noticiário das chuvas, é claro. O que vi, no final, não mudou a minha opinião sobre o que a imprensa, sobretudo a escrita, faz hoje. Já disse que os jornais estão se tornando irrelevantes e que estamos no caminho de uma mudança que sabemos da existência, mas não sabemos em que vai resultar, significando inclusive a possibilidade de os jornais como hoje os conhecemos não existirem dentro e um tempo a mais.
A questão da mudança está muito bem abordada em Jornais e Pensando o impensável, um artigo do Clay Shirky que traduzi e que está publicado, com a autorização dele. É um texto que acho vale a pena ser lido, mesmo por quem não é jornalista, mas se interessa pela informação e pela forma como ela é apresentada. Esta questão – do que é hoje e de como será amanh㣠– está muito presenta nas discussões de quem, de uma ou de outra forma, se atem ao que a mídia está fazendo. Veja-se blog como o Ponto Mídia, por exemplo, uma referência sobre os assuntos relacionados à mídia em língua portuguesa.
Mas voltando ao início, que é a leitura dos jornais, o que descobri? Em primeiro lugar matérias de “serviço”, cujo objetivo é ensinar ao leitor como fazer, como proceder em determinados campos, o que vai desde como arranjar um namorado via internet, a como se portar em determinadas situações, evitando pagar um mico. Ou então, matérias curiosas, com os micos dos políticos, que os confessam achando que estão fazendo sucesso ao contá-los, tornando-se objeto da mídia. Ou então guia de beleza, pretendendo ensinar as mulheres como ficar mais bonitas, apresentarem-se melhor. Assunto sério, de profundidade, que discuta a situação política, econômica e que faça diferença, nenhum.
Os jornais tornaram “digestivos”, que podem ser folheados, sem perda de tempo, focando-se em alguns assuntos que os editores entenderam ser do interesse dos leitores. Sob o ponto de vista crítico, no final, sobram as palavras cruzadas ou outros joguinhos que ocupam o tempo, dando alguma utilidade ao jornal. Pegando o que foi publicado no sábado, no domingo e na segunda-feira em dois jornais do Estado – A Tribuna e A Gazeta – em páginas e mais páginas, consegui ler, ainda assim de forma incompleta, uma única matéria. Pensando no assunto, agora, conclui que é muito pouco para o imenso esforço que é colocar uma publicação na rua, à disposição do leitor.
Talvez este final de semana tenha sido incomum, exatamente pelas circunstâncias, mas o que tenho ouvido nos círculos que frequento é que os jornais estão, em primeiro lugar, cada dia piores. E em segundo, que são todos iguais, o que decorre da recepção de matérias produzidas por agências que as distribui para vários veículos. Com isso, o que se lê em um, é exatamente igual ao do outro. E isso sem falar nas coincidências de pautas que fazem com que, em um final de semana, tenham novamente material assemelhado. O pior de tudo é que, com raras exceções, o que foi publicado pode ser encontrado na internet, com mais profundidade e com maiores detalhes. Neste caso, estão servindo material requentado, nada original.
Investigação, originalidade, profundidade, análise, nada disso esteve presente nas edições deste final de semana dos jornais de Vitória, pelo menos dos dois principais. E duvido que tenha sido muito diferente com o que é publicado no Rio de Janeiro, em São Paulo, em Brasília, em Porto Alegre, enfim, em qualquer cidade brasileira. Vivemos, sem dúvida, um momento em que os jornais estão se tornando irrelevantes, não conseguindo competir com os outros meios. Hoje, esta é a realidade. Como será o amanhã? Na verdade, ninguém sabe. E é por isso que estudiosos em todo o mundo se debruçam sobre o assunto procurando respostas.
Enquanto não acharmos uma luz no final do túnel, que aponte em um sentido, acho que vamos conviver com o curioso, com os manuais feitos às pressas e incompletos, com roteiros e conselhos. Afinal, os jornais continuam vendendo e, para quem não sabe, o Brasil é um dos poucos lugares do mundo em que a circulação está crescendo. Nos Estados Unidos, por exemplo, tem veículo que perdeu quase metade de sua circulação. E foi lá que os jornais se tornaram, efetivamente, um instrumento de construção da cidadania e da democracia. Foi a partir de lá que eles se tornaram relevantes, discutindo questões e apontando caminhos. E é de lá que vem as notícias de sua debacle.
Relevantes ou irrelevantes, o fato é que estamos no meio de uma mudança, só não a vendo quem não quer. Talvez estejamos em um ponto de virada, como aconteceu com a invenção e a adoção do tipo móvel, permitindo que o livro se espalhasse. Talvez esteja acontecendo com a mídia impressa o mesmo, agora, e ela esteja enfrentando um ponto de virada. O que virá? Como será? Em que se tornará? São questões que ninguém pode responder. Uma coisa, no entanto, é certa: se continuar irrelevante, acabará morrendo.
7 Respostas
Oi Lino.
Se não se reinventarem os jornais impressos vão servir apenas para embrulhar peixe. Ou nem isto, se a tinta de impressão for tóxica.
Um abraço.
Penso que o problema não está nos jornais, porque eles um dia migrarão para a internet, algo absolutamente natural. Os primeiros leitore online já estão aÃ.
O problema é o público.
O jornal do meu pai perdeu mercado, porque os leitores acham que suas matérias são “muito compridas”. Não querem ler nada com mais de 1 lauda, gostam de ler notinhase textos rápidos, que não exijam pensar…
…é amigo, Isso é curioso, mas é provável que um dia, num futuro meio distante, isso possa acontecer, o fim dos jornais impressos.
A queda das tiragens dos jornais é cada vez maior, na medida em que a Internet vai se desenvolvendo e alcançando públicos mais amplos.
Mas eu, particularmente, nao me vejo sem poder ler meu jornal, principalmente nos domingos, logo que acordo, um hábito adquirido com meu velho pai.
Vc como sempre, com textos informativos, e questionadores. Muito bom!
Um beijo, meu querido amigo!
Com a educação de hoje, a leitura se tornou menos interessante e entediante, porque muitos nem conseguem entender o que está escrito. Nem conseguem emitir uma opinião por falta de vocabulário e alguns tem preguiça para ler. A internet é muito mais atraente por ter imagens dinãmicas e vÃdeos, coisas que num jornal impresso não existem.
Para quem tem o hábito da leitura, o jornal sempre será um veÃculo importante. E olha que são poucos.
Olá!
Quanta coisa boa nessa pagina tua, Lino!
Já vou chamando assim, porque vi um recado teu em um blog agora pouco (mil desculpas, que não me lembro qual foi, rs) e achei legal o que vc escreveu, aà vim ver e cá estou apaixonada por essa página!
Realmente os jornais vão virar “páginas” rs e o difÃcil serão os leitores, concordo com o Fabio Meyer e concordo também com o Crazyseawolf quando fala que muitos nem tem vocabulário para responder, ter opinião quando lêem algo… uma tremenda pena , uma inversão de valores, eu arriscaria…
Bem o papo tá bom, mas vou indo!
Apareça conhecer nosso blog também!
Abraços!
Lino, a decadência dos jornais cariocas é visÃvel e talvez seja a mais emblemática do paÃs. Cresci lendo Correio da Manhã, Jornal do Brasil, Diário de NotÃcias, O Globo, Tribuna da Imprensa e por aà vai. Hoje em dia só sobrou O Globo e mesmo assim pelos motivos que já conhecemos de sobra; aliás, a organização do Roberto Marinho vive dependurada financeiramente no governo de plantão, qualquer que seja ele…
Enfim, os jornais não estão sabendo acompanhar os novos tempos.
O Fábio comentou que os leitores não gostam de matérias longas e eu concordo, basta ver que o mesmo acontece aqui na blogosfera.
O problema é mundial e nem sei se a migração para a internet vai salvar essas vestustas instituições. Em tempos de 140 palavras no Twitter, que há de sobreviver ?
Um abração.
Como a chuva anda castingando seu estado, né?
E, como já comentei por aqui, a mÃdia impressa anda cada vez mais rara, pelo menos pra mim…
Mas, apesar de baixar jornais, livros, revistas e etc, nada substitui o prazer de folheá-los…
Bjo e otima semana.